Introdução
O tremor essencial (TE) é uma das doenças mais comuns entre as patologias do sistema nervoso.
O TE é classificado como um tremor de ação, definido como um tremor que ocorre com a contração muscular voluntária.
Otremor de ação pode ser subdividido em:
- Tremor postural: ocorre na manutenção de posturas contra a gravidade;
- Tremor isométrico: ocorre quando há contração muscular contra um objeto inerte rígido;
- Tremor cinético: ocorre com os movimentos voluntários.
O TE é um tremor de ação postural e cinético, bilateral, em grande parte simétrico, que afeta mais frequentemente os braços (mais de 90% dos casos) e a cabeça (30% dos casos) e que é visível e persistente.
Este tremor de ação está presente nas atividades diárias banais como escrever e comer.
Estima-se que o TE atinga entre os 0,41% e os 3,92% das pessoas, sendo bastante mais frequente com o aumento da idade e atingindo três vezes mais os homens.
A prevalência pode mesmo atingir os 14% em pessoas com mais de 65 anos de idade. No entanto, pode também afetar as crianças, com idade média de começo situada nos 7 anos de idade.
Fatores de Risco
História Familiar
Existe história familiar da doença em 50% a 70% e o aumento dessa proporção é maior quanto mais precoce se estabelece o TE.
Consumo de Álcool
Os níveis elevados de consumo crónico de álcool aumentam o risco de desenvolver a patologia.
Exposição ao Chumbo
Um fator ambiental que tem sido estudado e parece estar envolvido na suscetibilidade para desenvolver TE é a presença de maior concentração de chumbo no sangue. No entanto, esta relação carece de mais estudos.
Alcalóides do grupo das β-carbolinas
Destacam-se deste grupo a partícula HAE e o seu metabólito HIE. A partícula HAE é bastante abundante na nossa dieta numa proporção maior que todos os restantes alcalóides do grupo das β-carbolinas, encontrada principalmente nas proteínas animais, embora também possa ser produzido endógenamente mas em concentrações mais baixas.
Individuos com maior concentração sanguínea de HAE e HIE parecem ter maior susceptibilidade ao aparecimento desta doença.
Atingimento de outros sistemas
Anteriormente acreditava-se que o TE era uma doença localizada, que não afetava outras funções cerebrais não motoras. No entanto, parece ser cada vez mais provável a hipótese de que indivíduos com TE têm maior propensão para:
- Ligeiros défices cognitivos;
- Perturbações de ansiedade;
- Fobias;
- Depressão;
- Perda mais acentuada do olfato, visão e audição;
- Perturbação do sono;
- Síndrome das pernas inquietas.
Como se diagnostica?
Existem vários critérios clínicos para classificação e diagnóstico da doença.
Deixamos os critérios do “The Washington Heights-Inwood Genetic Study of Essential Tremor”
Todos os cinco critérios devem estar presentes:
- Ao exame, presença de um tremor postural (+2)* em pelo menos um braço (o tremor da cabeça também pode estar presente, mas não é suficiente para o diagnóstico).
- Ao exame, deve existir:
- Um tremor de ação cinético (+2)* durante pelo menos 4 tarefas** ou
- Um tremor de ação cinético (+2)* durante 1 tarefa** e um tremor de ação cinético (+3)* na segundo tarefa**.
- Se ao exame, o tremor está presente na mão dominante, este tremor tem que interferir em pelo menos uma atividade diária (comer, escrever, beber). Se ao exame, o tremor está presente na mão não dominante, então este critério é irrelevante.
- Medicamentos, hipertiroidismo, etanol ou distonia têm de ser descartados como potenciais causadores do tremor.
- Causa psicogénica para o tremor tem que ser descartada.
* Classificação do tremor: +0= tremor não visível; +1= tremor de baixa amplitude (tremor mal percebido ou intermitente); +2= tremor de moderada amplitude (frequentemente presente e claramente oscilatório); +3= tremor de larga amplitude (violento; irregular). **Tarefas= Derramar água usando uma colher para beber água, beber água, manobra dedo-nariz e realizar espirais de desenho.
Deixamos o exemplo de uma espiral de desenho alterada:
Como se trata?
O tratamento do TE baseia-se essencialmente no tratamento farmacológico.
Existem dois fármacos utilizados na grande maioria dos casos de TE, o Propranolol e a Primidona, que conseguem reduzir de forma significativa os sintomas em mais de 70% dos casos. Apesar de ser preferível a utilização de apenas um fármaco, a associação dos dois parece ser mais eficaz no controlo da doença.
Existem outros fármacos que podem ser utilizados, como o Alprazolam, o Atenolol, a Gabapentina e o Topiramato.
Em casos graves que não respondam à terapêutica, poderá recorrer-se à cirurgia como última linha.
Prognóstico
A evolução desta doença é progressiva e eventualmente acabará por produzir incapacidades nas atividades básicas dos indivíduos, como comer ou conduzir. De facto, mais de 90% dos doentes com a patologia que se encontram com cuidados médicos referem algum grau de incapacidade.
Problemas associados como ansiedade e a depressão foram relacionados a uma maior incapacidade funcional nos indivíduos com a doença. Parece ser importante o controlo destes fatores para uma melhor convivência do doente com esta patologia.
Deixamos um pequeno vídeo com uma doente com TE em estadio avançado, demonstrando o quão incapacitante esta doença poderá ser.
– Dr. João Júlio Cerqueira – Especialista de Medicina Geral e Familiar –